quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Oxi!

Olá,

Pôr-do-sol em Macuse - Moçambique

Desculpem o tempo em que eu nao posto. A internet aqui as vezes é inconstante. As vezes também a vida é inconstante. As vezes? Talvez sempre...

Bem, depois do último post, muitas coisas aconteceram. Comentei que eu cai das escadas? Sim, rolei 8 degraus abaixo, torci meu pé já se vão dois sábados atrás e alguns dias. Espero que a dor passe... mas tá passando, não vou a hospital aqui... quero evitar a fadiga...rs

Eu com os meus alunos:dia de ralação e eu dando um esporrinho básico...
Em relação aos dias aqui posso dizer que tivemos uma semana bem turbulenta. A Primeira Ministra de Moçambique, Luiza Diogo, esteve presente na pequena cidade de Macuse, aonde me encontro. Bem, só vou comentar um pouco sobre isso. Estamos em épocas de eleições, acontecerá em outubro. Falar de conceito de democracia, eleições e qualquer outra coisa que esteja relacionado a política na África Austral, não podemos cair na idiotice de olharmos o nosso mundo para tentar entender ou julgar. Aqui esses conceitos são totalmente diferentes. O maior erro que vejo aqui dos estrangeiros é julgar a política local sem entender os desdobramentos para o atual estado das políticas africanas, da economia e da dependência externa. Mia Couto (autor moçambicano) em seu livro 'O último voo do Flamingo' citou: “Antes escondíamos a pobreza, agora percebemos que a pobreza é mais lucrativa”, outro comentário que aqui escutei foi de um secretário da pasta da Educação e Cultura, que aqui, como no Brasil eles denominam MEC: “não temos como imprimir mais livretos com diretrizes da educação bilíngue. Esse que nós temos foi subsidiado pela UNESCO, precisamos de mais parcerias para que possamos imprimir essas novas diretrizes, pois como vocês sabem, Moçambique não tem editoras capazes e nem tem como pagar por livros”. Nesse interím poderíamos dissertar sobre isso aqui no blog. Mas como já disse, pensar em Política na África Austral é você retirar a capa de informações que possui e começar do zero. Então meus amigos, irei usar da superficialidade para tentar passar para vocês um pouco que eu vejo, até porquê meus caros, para viver aqui na África Austral a ignorância é uma benção.

Bem, posso dizer que essa tal de ignorância nunca passou por mim, talvez isso tenha sido um dos motivos mais dificeis nesse primeiro mês que aqui estou no meu projeto. Somente consegui tirar minha capa quando perguntei para a senhora Mamá que trabalha em minha residência sobre o que o presidente que ela faz campanha vai fazer por onde ela mora e para a vida dela melhorar. Ela olhou para mim, respirou profundamente e disse que provavelmente nada. Mas antes de eu dar aquele sorriso maroto de uma garota esperta que pegou ali o cerne da questão e tentava fazer ela pensar na política ocidental, de buscar no voto o motivo para conseguir sair de tanta miséria, entra um fator que nós não levamos em questão: a guerra civil. Essa questão é o centro de toda a linha de raciocínio político aqui em Moçambique. Ambos os principais partidos daqui foram os atores principais dessa guerra. E para uma pessoa que mal terminou os estudos básicos, mas que cheirou a morte de perto, o horror de ser escravizada pelos próprios irmãos negros numa guerra estúpida que varreu boa parte dos países da África Subsaariana é um fator pobre. Daí meus amigos, eu falo para vocês, todo conhecimento é inútil se não ande junto com a sabedoria popular, com as vozes nas ruas, com os comentários dos loucos. Não irei comentar sobre o que ela me disse, irei fazer um filmete sobre isso na minha câmera e irei passar nos EUA e no Brasil, para tentar convencer a nossa classe intelectual que a vida vai muito além dos livros e dos nossos conhecimentos estáticos em frente ao nosso computador.

Primeira Ministra - Luiza Diogo com as Mamás Locais. Saudações tradicionais.

Vou voltar a Primeira Ministra. A mulher fala bem. 1 hora e meia falando sem em nenhum momento consultar um papel. Sabe de informações da localidade ao qual está sem consultar números e datas. O político africano é muito bom em discurso. É muito bom com as massas. Não comete tantas gafes como no ocidente.

Gente, há tantas, mas tantas coisas a se falar sobre política, mas vou seguir as dicas dos meus amigos voluntários: não comentar sobre nada isso. Principalmente aqui. Ser isento em opiniões. Como uma voluntária brasileira me disse: “o nosso melhor amigo aqui é a nossa passagem da South African Airlines para irmos embora. Ele é a nossa única família e a nossa única segurança.” Eu sou um pouco ousada, eu sei. Estive presente no discurso da ministra fechado para funcionários. Era a única branca no recinto, claro que eu era muito visada. Não pude filmar tudo. Quando chegou um dado momento o segurança pediu para eu parar. Gelei. Aqui se há muito medo. Eu não tenho tanto, mas gelei. Na mesma hora voltei para minha insignificancia e parei de filmar. Durante a apresentação dela para o povo, furei bloqueio de segurança, me senti uma jornalista. Pelo fato de eu ser branca, eles são as vezes benevolentes comigo. Até a hora de um segurança vir e me empurrar mandando eu sair da frente. Saí. Faz parte de quem quer as melhores filmagens e imagens. Consegui o que eu queria. Não ligo. Sinceramente, apesar de pedirem para eu parar com essa minha incursão no povo sobre a campanha eleitoral, eu continuo fazendo. Oportunidade única. E não tenho medo disso, tenho medo aqui é da cultura machista que nada tem a ver com a política. Isso me da medo, agora política? Não... Mas é melhor eu parar por aqui sobre esse assunto.

Estou pensando em raspar o meu cabelo. Aqui todos olham muito para ele e todos acham bonitos os nossos cabelos de “branco”, eu não gosto de ser diferente. Dependendo se eu acordar um dia muito corajosa, irei cortá-los, então já estejam avisados. Não que eu seja louca, no RJ vão achar que eu virei lésbica, mas os meus amigos vão saber que eu só não queria ser diferente...

No mercado e\ou shopping center local. Mercado de Macuse.





Bem, estou feliz, já toquei a água do Atlântico, do Pacífico e agora do oceano Índico. Da praia daqui posso dizer que a água e tão morna que dá vontade de ficar la dentro ate o sol dar adeus, mesmo aqui estando frio. Totalmente diferente do Brasil e EUA. Mas prezados, o medo de tubarão, que eu vi os pescadores carregando, não fez nem eu molhar minha coxa! Rs Falaram que é no auto mar que tem tubarão, mas vai saber né?! Ahuahuahuahau

Gente, a Carol, uma amiga minha ,voluntária também, e que já esta finalizando o projeto, veio aqui em Macuse visitar. Foram dias maravilhosos, mesmo ela trabalhando muito e eu também. Somos duas cabeçudas mesmos, levamos a sério demais nossos trabalhos! Mas valeu a pena cada momento... fomos no mercado e “causamos lá”, tiramos fotos, todos queriam tirar fotos... fizemos tudo que pudemos fazer... dançamos nas ruas, cantamos, brincamos com as crianças e fizemos algumas chorarem com medo de nós (ainda há crianças aqui que tem medo de branco, entao quando nos vê, chora e chora... a Carol queria dar mais sustos nelas... a Carol as vezes é pior que criança... rs)


Carol "causando" no mercado de Macuse.

Melhor terminar por aqui né!? Gente, estou pedindo doações para a escolinha local. Preciso de mil reais para garantir o funcionamento dela por um bom tempo e fazer com que ela se sustente sozinha sem a ajuda de voluntários ou de ajuda externa. Meu trabalho é esse aqui, não quero ver esse povo dependente eternamente, mas até para os primeiros passos há a necessidade de investimentos. Quem puder ajudar, podem me enviar um email: annabia7@gmail.com que eu irei dar a conta bancária para depósitos. Qualquer dinheiro faz a diferença. 5,10,15 ou qualquer um real faz a diferença... Material para mim seria melhor, como jogos lúdicos, revistinhas infantis, livros de todas as espécies, caderno, lápis de cor, hidrocor, papel, enfim, essas coisas são bem boas. Mas acho que fica mais caro pois o envio para cá é difícil, não sei quanto o correio cobra, mas quem quiser doar dessa forma, também me envia um email que iremos conversar. Um pouco de cada um de nós, ajuda muito a tirar essas crianças da miséria e dar para elas perspectivas de um futuro melhor.

Chapa. Nosso meio de transporte. É assim mesmo, bem cheio. No site das relações exteriores brasileiras diz que os estrangeiros nao usam esse meio de transporte aqui. Acho que o cônsul não conhece os voluntários...

Meus caros, obrigada por tudo

Amo vocês,

Bia

sábado, 12 de setembro de 2009

Muzubia

Ola,

Bem, hj la se vao 20 dias que aqui estou em Mocambique. Agora as coisas aqui estao melhores. Ja estou me adaptando, perdendo o nojo da agua. Aceitando a parca variedade de comida. Enfim, quando eu sai dos EUA sabia o que eu iria enfrentar, minha realidade aqui pessoalmente eh ate um pouco melhor que eu pensei. Mas, a teoria nunca e igual a pratica. Ha tentativas, mas ainda nao conheci uma teoria que na pratica fosse o literal. Entao, o inicio sempre eh dificil.

Essa semana estive bem mais proxima dos alunos, dando bastante aulas. E eu, como brasileira ja sou um caso a parte. E para quem me conhece dando aula ou treinamento sabe o meu estilo. Entao aqui ja virou hit. Em virtude do meu portugues nao ser o nativo, nao ser tambem o de portugal, que eh a base daqui, sempre pergunto aos alunos se eles estao me acompanhando e entendendo. Ai, daquele meu jeitinho falo: beleza? Pronto, agora aonde eu passo eles falam para mim, beleza? rs... Como eles veem muita novela brasileira, o fato de eu representar o que eles veem na TV os deixam maravilhados. Quando juntamos uns 150 alunos da EPF num mesmo local para darmos aquele aulao, la estao eles, em coro: beleza? rs... ate que eu gosto... eh engracado. Hj, ao fim deles cantarem a musica da escola, claro que da forma toda especial que eh um coro africano, mas aqui ja esta meio que maquinal. Eu estava sentada, olhando para eles da escada e comecei a pedir mais alto... para anima-los, na mesma hora eles aumentaram, cantaram mais felizes. Mas no final, la estava o beleza? ahuahauhauhau... o diretor que ainda nao tinha escutado ficou olhando para eles e eu respondendo, todos riram.

O Cafia-fia, um bichinho aqui do local anda fazendo algumas vitimas. Em virtude dos fortes vento na regiao, todos estao cocando e tendo que ir para o hospital arrumar remedios para curar. Isso pq esse pequenino inseto, que vive em mangueiras, solta um pelinho que em contato com a pele coca, mas coca de um jeito que nao ha como se aguentar. E ainda queima. Ainda bem que em mim ainda esta leve, so umas cocadinhas... ainda nao teve um contato muito forte. Mas com uma outra voluntaria, tb proveniente do Brasil o negocio foi um pouquinho mais serio. Foi no rosto e no olho. Fomos no hospital e no dia seguinte ja estava melhor. Mas enfim, ficam as marcas... rs

Quando fui ao hospital, vi uma cena que me chocou. Uma crianca brincando com 3 cilindros de acondicionar agulhas de seringas. Tirei educadamente da mao da crianca, tentei conversar com a mae. Mas em virtude de eu ja ser conhecida na regiao como senhora Formadora, as pessoas me respeitam e as vezes nao me escutam pq acham que eu estou dando algum esporro ou coisa do genero. Mas enfim, irei conversar com os reponsaveis do TCE que eh um projeto tb da Humana que trabalha com o controle de HIV/AIDS para eles irem la e educarem as pessoas. Also, eu vi aqui na escola uma crianca de 5 anos brincando com um aparelho descartavel barbeador. Como todas as criancas, elas sempre pegam as coisas do chao para brincar, o unico problema e que aqui as pessoas jogam tudo pelo chao. Preciso pensar numa forma de conscientizar sobre a importancia com o cuidado com o lixo. Principalmente desses materiais que podem transmitir HIV/AIDS.

Ontem, depois de varias tentativas frustadas de transmitir um documentario, isso que o computador de um outro voluntario quebrou, enfim, tudo aconteceu ontem, conseguimos depois de 5 horas projetar um filme que eu trouxe dos EUA. Nao era um documentario, mas como todos estavam esperando alguma coisa, tivemos que improvisar. Antes do filme teve a motivacao inicial, clipes do AKON. Eles amam Akon por aqui, e num dos clipes la estava o que eh normal no Hip Hop americano, uma mulher bonitona, com o corpo a mostra. Pronto, o local que tinha provavelmente umas 160 pessoas foi abaixo. Os mocambicanos ainda sao bastante conservadores e eles comecaram a gritar muzibia, muzubia, muzubia... fui tentar entender, eles nao queriam me explicar, mas depois eles me explicaram, para a visao deles eh mulher de vida facil, que sempre esta com muitos homens... rs rs rs... ai ja estavamos tentando arrumar algum clipe para ver os muzubios! ahuahauhauhauahuahauhauhau...

Bem gente, eh isso. Continuo essa vidinha de voluntaria aqui em Macuse, trabalhando forte, bebendo agua de coco durante os intervalos, ainda nao fui a praia mas tentarei amanha... he he he

Boa semana para todos!

Bia

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Chegando em Mocambique



Ola a todos,

Hoje o dia esta um tanto quanto diferente: EU TENHO INTERNET!


Para comecar, no dia 23/08 sai de San Francisco - US em direcao a Washington DC, depois de 6 horas de um voo tortuoso, apertado e faminta, peguei meu proximo voo em direcao a Johanesburg - Africa do Sul.




Quando o voo da SouthAfrican Airlines levantou de Washington, chorei. Chorava que nem crianca. Passei 11 meses lutando para conseguir ir para Africa. 11 meses longe de todos que eu amo, 11 meses de luta, de sofrimento, de felicidades, de ralacao. Parei minha vida para entrar naquele aviao. Todos os meus projetos foram adaptados para que eu pudesse fazer algo que eu realmente acreditasse na minha vida. E la estava eu.




No dia 25/08 cheguei em Maputo, capital de Mocambique. Minha primeira impressao do aeroporto de la foi: eh... aqui nao eh mais pais em desenvolvimento. O aeroporto de la parece muito com rodoviaria de interior do Brasil. Uma das minhas malas nao chegaram. Abriram ocorrencia e falaram para eu esperar. Perguntei: Como assim esperar?! Nao ha como rastrear e se eu ligar vcs podem me falar a posicao dela? - a resposta foi somente essa: tem que se esperar. Pronto, agora eu tinha certeza que estava na Africa.




Minha mala chegou sim, no dia seguinte, como se eu tivesse pego aquele voo, eu estava la a esperar... em nenhum lugar q passei isso era possivel, entrar na area de desembarque... mas visto que eu estava em Maputo, claro q era possivel, ate pq se nao tivesse la, minha mala talvez eu nunca mais veria...




Meus dias na capital foram bons. Fui a um ensaio de uma banda local de musica africana. Mas meu destino era Macuse. Uma cidade costeira, ao norte de Mocambique. Foram mais 4 dias de viagem ate finalmente chegar em Macuse.




Posso falar um pouco do caminho. O meu primeiro meio de transporte foi um machimbombo. Seria algo no Brasil como onibus pirata da pior qualidade possivel. Fui sentada na metade do banco, pq ao meu lado tinha uma familia composta de pai, mae e filho. Entao sobrou para mim um espacinho... Nesse primeiro dia sai de Maputo em direcao a Beira. Comeceii 5 da manha e cheguei ao meu destino 11 da noite. As estradas de mocambique nao existem. Nao ha qualidade nenhuma. Um risco a todos. Por isso ha um grande numeros de acidentes por aqui. Tive que ficar dois dias em Beira. Uma cidade tao suja quanto Maputo. Ambas as cidades posso dizer que sao como se fosse uma Sao Goncalo da vida. Ruas pavimentas sim e nao, caos no transito, casas simples... uma sao goncalo de 10 anos atras em algumas partes... em Maputo eh uma sao goncalo atual.




Saindo de Beira, parti em direcao a Quelimane. Quarta maior cidade de Mozambique. O caminho beira para quelimane foi o mais tortuoso de todos. Nao pela qualidade de onibus, pq dessa vez fui de auto-carro (onibus no portugues local) com ar condicionado e direito a musica brasileira (lembrei da Dani, uma amiga que conheci no CCTG e gosta dessas musicas sertanejas... la estavam essas musicas... rs). O problema foi a miseria. Maputo vive na miseria conforme alguns leram na reportagem do Jornal O Globo, mas indo para o norte, distanciando da capital, as coisas complicam mais. O onibus parava e via uma legiao de vendedores ambulantes. Todos implorando para comprar uma coca, um bolo ou algo que nem sem denominar. Todos implorando. Tinha mais vendedores, esses que sao criancas, mulheres e homens, que passageiros. Queria chorar... todos sujos, fedorentos... minha janela trancada pelo ar nao deixava o cheiro entrar, mas dava pra entender o que se passava ali fora. Alguns meninos botavam a cara na janela e ficavam olhando para dentro do onibus. Queriam ver as brancas que ali estavam. Foi um momento que ficara guardado para todos os dias da minha vida. Uma miseria indescritivel. Algo que nenhum jornal ou blog conseguira descrever. Imaginem falar nao para mais de 30 criancas te pedindo dinheiro? Eu tinha que falar. Porque se eu desse para uma, iria se espalhar rapidamente e em cada parada de onibus teria gente a pedir... mas sempre tinham. Era muito dificil. Pensei no Marco vivenciando aquilo. Sei que ele nao diria nao para aquelas criancas, mas sei que depois ele iria se entristecer, pq nao tem como darmos a todos que nos pedem...




Mas continuando caminho, cheguei em Macuse dois dias depois de chegar em Quelimane. O motorista nunca aparecia para nos pegar...rs




Mas cheguei aqui em Macuse. Moro num casarao de 5 quartos estilo portugues. Macuse foi uma vila portuguesa destruida durante a guerra civil. A EPF aqui esta localizada em frente a um porto portugues, as salas foram adaptadas e restauradas. Muitas das coisas restauradas aqui nessa cidade foi fruto do trabalho de varias ONGs, nao so a Humana.




Bem, depois eu posto mais... obrigada por tudo...




Bia